PATII – Programa Avançado de Tratamento da Insuficiência Intestinal inova no cuidado de crianças complexas no Brasil
A falência intestinal é uma das condições mais debilitantes que pode acometer um indivíduo. Com a capacidade de digestão e absorção comprometidas, o paciente apresenta desnutrição grave e perda drástica da qualidade de vida.
Transtornos como síndrome do intestino curto e enterocolite necrosante são ainda mais complexos, e muitas crianças não sobrevivem ao período neonatal por falência intestinal ou complicações de seu tratamento. Como os casos de enterocolite necrosante e outras condições que levam à falência intestinal ocorrem de maneira pulverizada em todos país, na maioria das vezes os hospitais não têm equipes especializadas neste tipo de cuidado e esta ausência é o principal fator que compromete a boa evolução do paciente.
Para mudar esse cenário, o Sabará lançou, em 2018, o Programa Avançado de Tratamento da Insuficiência Intestinal, o PATII. O programa foi estruturado pela cirurgiã pediátrica Dra. Maria Paula Coelho, que estruturou uma equipe multidisciplinar no Sabará, estabelecendo protocolos baseados nos guidelines internacionais para tratamento desta condição crônica e complexa, permitindo uma profunda melhora na qualidade de vida das crianças portadoras de falência intestinal.
Para a médica, é essencial a preocupação não apenas com a sobrevivência das crianças, mas também com uma vida de qualidade, buscando a desospitalização e o retorno ao convívio familiar e as atividades adequadas para cada faixa etária, como a escola, por exemplo. “Essas crianças e seus familiares podem alcançar uma qualidade de vida muito boa, entendendo que possuem uma condição crônica complexa que pode demandar o uso de dispositivos alimentares, como sondas ou cateteres venosos, o que lhes dá características e necessidades específicas, mas não as torna doentes. Existe o desafio de conscientizar não só os pais, para que busquem todo o potencial de seus filhos, mas a própria comunidade de saúde, para que enxerguem as possibilidades dessas crianças para além do primeiro momento gravíssimo, onde decisões importantes são tomadas e onde o encaminhamento para centros especializados define o futuro da criança. Precisamos também divulgar essa condição rara, para que toda a nossa sociedade conheça e acolha estas crianças, proporcionando oportunidades como já faz para diversas outras condições crônicas”.
No PATII, as crianças são atendidas em caráter hospitalar ou ambulatorial, por uma equipe transdisciplinar especializada, com nutricionista, gastropediatra, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, nutróloga, enfermeiros-navegadores, psicólogo, child life specialists, cirurgião pediátrico, entre outros. O objetivo é manter o suporte e cuidado especializado durante toda a jornada da criança, muitas vezes começando antes mesmo que seja transferida ou internada no Sabará, quando auxiliamos a equipe do hospital de origem na estabilização da criança evitando complicações que podem ocorrer muito precocemente.
“É um trabalho diário e contínuo, pois não se resume em saber quantas calorias o bebê precisa, mas entender tudo o que pode ser feito para potencializar o desenvolvimento dessa criança. Isso significa tirá-la do hospital o mais breve possível, adaptar sua rotina para que possa ir à escola e compartilhar dos momentos sociais com a família. Isso inclui enviá-la para casa de forma segura, fazer relatórios e reuniões com a equipe da escola e fazer parcerias com o home care. As equipes precisam entender como se trabalha na reabilitação intestinal e pensar no futuro deste paciente. Planejamento de longo prazo é fundamental para estas crianças”, completa.
“Outra iniciativa fundamental para o cuidado humanizado, trazendo conforto e segurança a estas famílias é o planejamento e implementação do cuidado híbrido, isto é, os atendimentos dos profissionais são feitos à distância sempre que possível e presencial apenas quando necessário. A telessaúde é uma estratégia fundamental para o cuidado das crianças com condições crônicas complexas de qualquer região do país”, destaca o Dr. Rogério Carballo, gerente médico de Inovação do Sabará.
O tratamento a longo prazo e o investimento no treinamento das equipes são alguns dos diferenciais do Sabará. De acordo com a Dra. Maria Paula, criar um programa de reabilitação intestinal é compreender que lidamos com uma condição que acompanhará o paciente por toda a sua vida, com maior ou menor demanda em alguns momentos.
“Quando algum colega me diz que quer criar um programa de reabilitação intestinal, eu pergunto: ‘sua instituição compreende o que você está propondo? Porque as crianças que cuidamos entram em um leito e podem permanecer muitos meses, e quando tem condição de alta, o tratamento especializado deve continuar no ambiente domiciliar. Só funciona se a instituição se propuser a cuidar de casos complexos por toda a jornada do paciente, assim como o Sabará”, completa.
Enterocolite Necrosante
Uma das condições mais graves ligadas a problemas de saúde intestinal é a enterocolite necrosante (ECN), doença rara que atinge entre 5% e 10% dos bebês nascidos prematuros de muito baixo peso. Na maioria dos casos, o bebê não precisa de cirurgia, respondendo ao tratamento clínico, porém a taxa de mortalidade é ao redor de 20-30%.
A enterocolite necrosante é uma lesão que se inicia na superfície interna do intestino que pode progredir e chegar até a perfuração intestinal. Clinicamente, pode se manifestar através de fezes com sangue, aumento do volume abdominal, e vômitos. O tratamento envolve a suspensão da alimentação do bebê, hidratação endovenosa, alimentação parenteral (endovenosa), realização de radiografias para avaliar a progressão da doença e eventualmente procedimentos cirúrgicos. A enterocolite é a maior causa de Síndrome do Intestino Curto em crianças.
“A enterocolite necrosante é um quadro inflamatório do trato gastrointestinal que pode ocorrer de forma leve, sendo tratada com cuidados clínicos, até um quadro mais grave, onde pode ser necessário um procedimento cirúrgico para retirada de parte do intestino. Para um bebê que sofre este dano, podem ocorrer prejuízos na absorção de macro e micronutrientes, eletrólitos e água, que são essenciais para o desenvolvimento. Por isso, estes pacientes precisam do acompanhamento com equipe especializada, para otimizar a nutrição a fim de evitar prejuízos no desenvolvimento deste bebê”, explica a nutricionista Ingridy de Melo, membro da equipe do Programa Avançado de Tratamento da Insuficiência Intestinal.
O diferencial do enfermeiro navegador no PATII
O Enfermeiro Navegador é o elo entre a equipe médica, o paciente, a família e questões sociais e estruturais que existem em qualquer tratamento de alta complexidade em uma instituição de saúde. Desenvolvida nos Estados Unidos, a Navegação de Pacientes na pediatria é novidade no Brasil – mais uma inovação utilizada pelo Sabará.
Essa nova especialização dentro da enfermagem segue a linha do tratamento humanizado pediátrico, no qual a experiência da criança é sempre prioridade e a família é vista como parte essencial do tratamento. Por estar perto do paciente e seus Cuidadores, o enfermeiro navegador é uma peça-chave para o andamento do tratamento e a integração entre os diferentes médicos e especialistas envolvidos no plano de cuidado da criança.
“O profissional tem uma visão horizontal de todo o percurso do paciente dentro da instituição, pois está em contato com ele e com todos os profissionais envolvidos no tratamento do início ao fim”, explica Gustavo Oliveira, enfermeiro navegador do Programa Avançado de Tratamento da Insuficiência Intestinal.
O trabalho do enfermeiro navegador começa mesmo antes da chegada do paciente ao hospital, com uma entrevista inicial na qual a equipe determina as necessidades do paciente e as barreiras para o tratamento. “Nesta avaliação também fazemos todas as orientações sobre o programa, alinhamos expectativas e fazemos o direcionamento para a equipe que realizará o atendimento. Uma vez identificadas as barreiras que podem dificultar o atendimento, criamos junto com a equipe multidisciplinar estratégias para facilitar a adesão ao tratamento. A partir deste primeiro contato, criamos um vínculo com a família, proporcionando um atendimento mais humanizado e individualizado”, completa Gustavo.