Vacinação de gestantes é essencial para frear o avanço dos casos graves e das mortes por coqueluche em bebês no Brasil
É incompreensível que ainda tenhamos mulheres que terminam a gravidez sem serem alertadas da necessidade desta vacina”, explica o pediatra e infectologista Dr. Marco Aurélio Sáfadi
O aumento no número de casos de coqueluche é um fenômeno no mundo todo. No Brasil não é diferente: este ano, já foram confirmados em nosso país 1606 casos de coqueluche e 9 mortes, um salto considerável em relação aos últimos anos. Para efeito de comparação, em 2021, 2022 e 2023 foram confirmados, respectivamente, 149, 236 e 199 casos .
Segundo o Dr. Marco Aurélio Sáfadi, coordenador da infectologia pediátrica do Sabará, essa alta de casos tem relação com o fato de termos tido um período de reduzida circulação da coqueluche durante os primeiros anos da pandemia de covid-19, criando um acúmulo de susceptíveis na população, agravado pela queda das taxas de cobertura vacinal verificada em igual período, um fenômeno que em particular no Brasil acomete de forma muito preocupante a nossa população.
“Durante a pandemia, o uso de máscaras, fechamentos de escolas e redução do trânsito de pessoas causaram a redução das taxas de incidência de várias doenças que dependem de transmissão respiratória. A coqueluche é uma delas. Entre 2020 e 2023, tivemos uma diminuição muito grande dos casos de coqueluche, fazendo com que pela primeira vez ficássemos 3 anos consecutivos sem nenhum registro de morte nos dados do Ministério (entre 2021 e 2023). Entretanto, a partir do final de 2023, começamos a verificar uma recrudescência dos casos com aumento das notificações. As faixas etárias mais acometidas este ano são a de bebês, menores de 1 ano, seguida pelo grupo de crianças e adolescentes de 10 a 14 anos”, explica ele.
O Dr. Marco Aurélio conta que, neste momento no Brasil, observamos um aumento das taxas de incidência em crianças mais velhas e adolescentes, com alguns surtos escolares. É muito provável que a disponibilidade de novos métodos diagnósticos mais sensíveis, especialmente em hospitais privados como o Sabará, tenha contribuído para esta realidade. “A maioria dos surtos que temos visto são em idade escolar, entre crianças mais velhas e adolescentes, um fenômeno já reportado pelos Estados Unidos no passado. Isso se deve à chegada de métodos diagnósticos mais sensíveis e próximos dos clínicos, especialmente em hospitais privados como o Sabará. A partir dessa nova biologia molecular, que hoje está ao alcance de um maior número de médicos, conseguimos identificar casos que no passado seriam impossíveis de serem diagnosticados. Isso é muito importante para entendermos o cenário que vivemos hoje”.
Falta de políticas públicas que revertam este cenário de baixas coberturas vacinais em gestantes é fator importante no retorno de hospitalizações e de mortes por coqueluche em bebês no Brasil
Assim como no caso da covid-19, a vacinação não impede o contágio e a transmissão da doença, mas é essencial na redução da gravidade dos casos, intensidade dos sintomas e no risco de hospitalização. “É importante compreender que a vacina da coqueluche tem um efeito muito importante na prevenção de casos graves e de óbitos causados pela doença. Mas, a exemplo de vacinas como covid-19 e influenza, a imunização contra a coqueluche não impede que a pessoa vacinada possa desenvolver uma forma leve da doença e a transmita aos outros ao seu redor”.
O grupo de risco mais fragilizado para a ocorrência de casos graves e de mortes quando falamos de coqueluche é o de bebês, especialmente nos primeiros meses. Para protegê-los, é essencial que o Brasil intensifique o impacto das campanhas de vacinação para gestantes, já que bebês só podem ser vacinados após os dois meses de idade. “Há cerca de dez anos atrás, implementamos uma estratégia no Brasil que se mostrou extremamente importante, que foi a vacinação da gestante. Essa é a única estratégia possível para proteger um bebê nos primeiros meses de vida. Quando a mãe é vacinada, ela constrói uma resposta de anticorpos e transmite essa proteção via placenta para o feto. Desta forma, o bebê nasce com um grau de proteção que permanece até os dois meses de idade, quando ele já pode tomar a primeira dose da vacina contra a coqueluche”, explica o médico.
Para o especialista, é essencial a adoção imediata de políticas públicas que divulguem de forma eficiente a vacinação para gestantes. “É incompreensível que ainda tenhamos mulheres que terminam a gravidez sem serem alertadas pelos profissionais de saúde da necessidade desta vacina. Ela é gratuita e está em todos os postos de saúde, mas 40% ou mais das mulheres terminam a gravidez sem ter tido a oportunidade de se vacinar. E não por falta de vontade, mas em muitos casos por falta de informação”.
A vacina deve ser administrada na gestante a partir da 20ª semana de gravidez e, de preferência, até o início do terceiro trimestre , para que o organismo tenha tempo para produzir anticorpos em quantidade suficiente para gerar uma proteção adequada e transmiti-la ao feto.